PERÍODO INTERTESTAMENTÁRIO – PARTE I

Acontecimentos políticos1

 

Este período entre os escritos do AT e o NT é chamado com frequência de “anos silenciosos”, uma designação, contudo, equivocada. Apesar de nenhum profeta inspirado ter surgido em Israel durante esses séculos e de se considerar que o AT estava completo, os acontecimentos ocorridos neste período conferiram ao judaísmo posterior a sua ideologia distintiva e se mostraram providenciais ao preparar o caminho para a vinda de Cristo e a proclamação do Seu evangelho. A história desses anos segue o padrão predito em Daniel (Dn 2.24, 45; 7.1-28; 11.1-35) com precisão exata. Embora a voz de Deus estivesse silente, a sua mão estava ativamente direcionando o curso dos acontecimentos durante esses séculos.

 

A supremacia persa

O império persa exerceu controle sobre a Judéia durante cerca de um século depois do tempo de Neemias. Foi um período relativamente tranquilo, pois os judeus receberam permissão de observar suas práticas religiosas sem que ninguém os incomodasse. Nesse tempo, a Judéia foi governada por sumos sacerdotes que prestavam contas ao governo persa, facto que garantiu aos judeus grande autonomia e corrompeu o sacerdócio transformando-o em uma posição política. Inveja, intrigas e até homicídio fizeram parte da competição pelo título honorífico de sumo sacerdote. Diz-se que Joanã, filho de Joiada (Ne 12.22), matou seu irmão Josué dentro do próprio templo.

Nesse período, a Pérsia e o Egito se viram envolvidos em conflitos incessantes e, uma vez que estava situada entre as duas nações, a Judéia não teve como ficar de fora desses atritos. Durante o reinado de Artaxerxes III (Ochus), vários judeus participaram de uma insurreição contra a Pérsia e foram deportados para a Babilónia e para o litoral do mar Cáspio.

 

Alexandre, o Grande

Na sequência da derrota dos exércitos persas na Ásia Menor (em 333 a.C.), Alexandre marchou em direção à Síria e à Palestina. Depois de resistir obstinadamente, a cidade de Tiro foi tomada e Alexandre se deslocou para o sul, em direção ao Egito. Diz a lenda que, quando Alexandre se aproximou de Jerusalém, Jadua – o sumo sacerdote judeu – foi ao seu encontro e lhe falou das profecias de Daniel, segundo as quais o exército grego seria vitorioso (Dn 8). Este episódio não é considerado verdadeiro pelos historiadores, mas é facto que Alexandre tratou os judeus com bondade. Permitiu que eles observassem suas leis; concedeu-lhes isenção tributária no ano sabático e, ao construir Alexandria no Egito (331 a.C.), incentivou-os a mudar para essa cidade, oferecendo-lhes privilégios comparáveis àqueles reservados exclusivamente a seus súditos gregos.

 

A Judéia sob o governo dos Ptolomeus

Depois da morte de Alexandre (323 a.C.), a Judéia ficou primeiramente sob o governo de Antígono, um dos generais de Alexandre que controlava parte da Ásia Menor. Em seguida, caiu nas mãos de outro general, Ptolomeu I (a essa altura, governante do Egito), apelidado de Soter ou Libertador, que tomou Jerusalém em um sábado de 320 a.C. Ptolomeu também foi bondoso com os judeus. Muito deles se assentaram em Alexandria, que continuou a ser um importante centro do pensamento judaico por vários séculos. Durante o governo de Ptolomeu II (Filadelfos), os judeus de Alexandria traduziram sua lei, i.e., o Pentateuco, para o grego. Essa tradução ficou conhecida como Septuaginta, devido à lenda segundo a qual setenta tradutores (mais precisamente 72 – seis de cada tribo) haviam recebido inspiração sobrenatural para produzir uma tradução infalível.

 

A judéia sob o governo dos selêucidas

Depois de aproximadamente um século, durante o qual os judeus permaneceram sob o domínio dos Ptolomeus, Antíoco III (o Grande) da Síria tomou a Síria e a Palestina à força, do Egito (198 a.C.). Os governantes sírios são conhecidos como selêucidas, pois seu reino, construído sobre as ruínas do império de Alexandre, foi fundado por Seleuco I (Nicator).

Durante os primeiros anos do governo sírio, os selêucidas permitiram que o sumo sacerdote continuasse a governar sobre os judeus segundo suas próprias leis. No entanto, surgiu um conflito entre o partido helenista e os judeus ortodoxos. Antíoco IV (Epifânio) aliou-se ao grupo helenizante e nomeou para o cargo de sacerdote um homem que mudou seu nome de Josué para Jason e incentivou o culto a Hércules de Tiro.

Dois anos mais tarde, porém, Jason foi deposto por outro helenista, um rebelde chamado Menaém (gr. Menelau). Quando os partidários de Jason entraram em confronto com aqueles que favoreciam Menelau, Antíoco invadiu Jerusalém, saqueou o templo e matou um grande número de judeus (170 a.C.). Os direitos civis e religiosos foram revogados, os sacrifícios diários foram proibidos e um altar a Júpiter foi erguido no lugar do altar do holocausto. Cópias das Escrituras foram queimadas e os judeus foram obrigados a comer carne de porco oferecida sobre o altar do holocausto em demonstração de desprezo pela consciência religiosa judaica.

 

Os macabeus

Os judeus oprimidos não demoraram a encontrar um defensor. Ao chegarem à vila de modina, cerca de 14 quilómetros a oeste de Jerusalém, os emissários de Antíoco esperavam que Matatias, um sacerdote idoso, desse o exemplo para o povo e oferecesse um sacrifício pagão. Ele não apenas se recusou a fazê-lo como também matou um judeu apóstata no altar pagão, junto com o oficial sírio que dirigia a cerimónia. Matatias fugiu para a região montanhosa da Judéia e organizou, com seus filhos, uma guerrilha contra os sírios. Apesar de não ter vivido para ver seu povo ser libertado do jugo sírio, o sacerdote idoso incumbiu seus filhos de completar essa tarefa. Quando Matatias faleceu, seu filho Judas, apelidade de “o Macabeu”, assumiu a liderança.

Em 164 a.C., Judas recuperou o controle de Jerusalém, purificou o templo e reinstituiu os  sacrifícios diários. Logo depois das vitórias de Judas, Antíoco faleceu na Pérsia. No entanto, as lutas entre os macabeus e os governantes selêucidas estenderam-se por mais vinte anos.

Aristóbulo I foi o primeiro govenante macabeu a usar o título “Rei dos Judeus”. Depois de um reinado breve, foi sucedido pelo tirânico Alexandre Janeu, que, por sua vez, deixou o reino para sua mãe, Alexandra. O reinado de Alexandra foi relativamente tranquilo e, ao morrer, um dos seus filhos mais jovens, Aristóbulo II, usurpou o trono de seu irmão e sucessor por direito. Logo em seguida, Antípater, governador da Iduméia, abraçou a causa de Hircano, gerando ameaças de uma guerra civil. Em decorrência, Pompeu invadiu a Judéia com suas legiões romanas, decidido a resolver a questão e promover os interesses de Roma. Aristóbulo procurou defender Jerusalém dos ataques de Pompeu, mas os romanos tomaram a cidade e entraram no Santo dos Santos do tempo, sem, no entanto, tocar em nenhum dos tesouros.

 

Roma

Marco António apoiou a causa de Hircano. Depois do assassinato de Júlio César e de Antípater (pai de Herodes) – que, em termos práticos, exerceu poder sobre a Judéia –, Antígono, o segundo filho de Aristóbulo, procurou tomar o trono para si. Chegou a governar em Jerusalém durante algum tempo, mas Herodes, filho de Antípater, voltou de Roma e tornou-se o rei dos judeus com o respaldo romano. Seu casamento com Mariane, neta de Hircano, serviu-lhe de elo com os governantes macabeus.

Herodes foi um dos governantes mais cruéis de todos os tempos. Assassinou Hircano, respeitado líder (31 a.C.), e mandou executar a própria esposa Mariane e seus dois filhos. Já no leito de morte, Herodes ordenou a execução de Antípater, seu filho com outra esposa. Nas Escrituras, Herodes é conhecido como o rei que mandou matar as crianças de Belém por temer a rivalidade daquele que havia nascido para ser o Rei dos Judeus.

 

 


1Adaptado do texto “From Malachi to Matthew” [“De Malaquias a Mateus”] de Charles F. Pfeiffer; Moody Bible Institute of Chicago, © 1962. In A Bíblia Anotada Expandida – Charles C. Ryrie, p. 897-900.


Bibliografia